Boa Vontade
Emmanuel, no livro
Pão Nosso, traz duas mensagens em sequência: Boa Vontade
e Má Vontade. Na primeira delas, o autor destaca que é pela
“simples boa vontade que a criatura alcançará o Divino Reino da
Luz”. Isso contraria o dito popular que diz que “de boa vontade,
o inferno está cheio!” Não concordamos com esse provérbio,
naturalmente, pois, em geral, o que se atribui à boa vontade é
apenas intenção, sem que se dê o passo seguinte, tão bem expresso
na mensagem que estaremos abordando.
Na lição que o
autor nos traz, é apresentado um encadeamento de ações e
resultados, os quais, por sua vez, transformam-se em novas ações e
consequentes resultados, até atingir o resultado final que é a
integração com o Divino.
Assim, no início
da mensagem, destaca-se um importante encadeamento de ação e
resultado:
Boa vontade descobre trabalho.
Trabalho opera renovação.
Entendendo que a boa vontade é o “nosso recurso de cada hora”,
como afirma Neio Lúcio em Jesus no Lar, percebemos que a
oportunidade do trabalho está sempre à nossa disposição.
O trabalho, respondem os espíritos a Kardec, é “Lei da Natureza”,
é uma necessidade e meio de aperfeiçoamento intelectual, por
direcionar os homens ao atendimento de suas necessidades materiais.
Não é um trabalho que visa apenas a conservação, como acontece
com os animais (Livro dos Espíritos q. 677), mas condicionado pelo
avanço da civilização em que nos encontramos inseridos. Assim,
mesmo nos mundos mais aperfeiçoados, o trabalho permanece, embora
seja menos material em razão da própria condição apresentada por
esses tipos de orbes.
Retomando Neio Lúcio, ao
sinalizar que há uma permanente disponibilidade de trabalho, podemos
avaliar as diversas oportunidades de trabalho que nos são
disponibilizadas e que conduzem a um estado de renovação. Nesse
texto citado – A Regra de Ajudar – há um diálogo entre
Cristo e João, onde o Mestre lhe diz que se quer ajudar aos demais,
beneficiando a si próprio, deve se lembrar de amá-los da mesma
forma que deseja ser amado por eles. A seguir, são apresentadas
diversas situações onde o esforço pessoal está presente. Assim,
temos:
-
não cultivar a verdade como um combatente atravessando o campo de batalha, pois a maioria das pessoas conhece sua própria moléstia, necessitando de amizade e entendimento;
-
há corações na terra com problemas difíceis de serem resolvidos, demandando cortesia fraternal;
-
não cumprimentar o irmão do caminho apenas com a polidez da educação, mas com “sincero propósito de servir”;
-
olhar nos olhos aqueles que nos dirigem a palavra, demonstrando interesse e colocando-se na posição de “ouvinte delicado e atencioso”;
-
afastar-se de conversações improdutivas, lembrando que comentários menos dignos são invasão de questões pessoais;
-
louvar quem trabalha e, mesmo diante dos ociosos, exaltar o bem que são capazes de produzir;
-
fugir ao pessimismo;
-
usar a “chave luminosa do sorriso fraterno”.
Quase ao término da lição e pouco antes de finalizar afirmando a
importância da boa vontade como recurso de todo momento, o Cristo
aconselha:
Façamos, sobretudo, o melhor que pudermos na felicidade e na
elevação de todos os que nos cercam, não somente aqui, mas em
qualquer parte, não apenas hoje, mas sempre.
Esse é o processo de renovação, de nossa maneira de sentir, de
pensar, de agir.
A
forma de garantir a continuidade dessa maneira de proceder está na
citação no início da lição Boa Vontade,
a qual alerta: “Vede prudentemente como andais.” (Efésios, 5:15)
Na sequência da
mensagem, Emmanuel afirma que
Renovação encontra o bem.
Pensamos, sentimos e agirmos diferente de antes. Nossa mente e nosso
olhar estão dirigidos para algo maior e grandioso que, por vício no
mal, deixamos de enxergar.
O bem revela o espírito de serviço.
A
nova maneira de nos relacionarmos com a vida nos traz à tona de
nossa alma o sincero desejo do trabalho em favor do próximo. Não
mais o olhar autocentrado que cega em relação ao próximo e às
questões por ele vivenciadas.
O espírito de serviço alcança a compreensão.
A compreensão ganha humildade.
A humildade conquista o amor.
A humildade, como encontramos no Evangelho Segundo o Espiritismo,
é apresentada como um “ato de submissão a Deus”, destacando a
importância de sermos ricos em qualidades morais. Lacordaire diz que
os grandes exemplos de humildade que recebemos são muito pouco
seguidos e que não podemos ser caridosos sem ela, pois é um
sentimento que nos nivela como irmãos. A compreensão que se
desenvolve a partir do espírito de serviço nos auxilia a perceber a
importância e dimensão da humildade.
E a humildade nos conduz a um passo bem maior, de uma importância
ímpar. É dessa forma que vamos verificar que Paulo (1
Cor. 13:1) adverte que, mesmo que falasse a língua dos homens e dos
anjos, “se não tivesse amor seria como o metal que soa ou como o
sino que tine”. Mesmo com o dom da profecia, conhecedor de todos os
mistérios e ciência, e ainda que tivesse fé capaz de transportar
montanhas, “e não tivesse amor, nada seria”. Assim,
está posta a importância do amor, cuja capacidade de amar é inata
ao ser humano, como afirmava
São Basílio.
Continuando,
O amor gera a renúncia.
A renúncia atinge a luz.
A luz realiza o aprimoramento
próprio.
Renúncia a tudo o que não seja de
ordem divina, o que nos leva à iluminação, que se traduz na
compreensão da natureza de maya
(termo que, na sua forma mais geral, pode ser entendido como a ilusão
que constitui a natureza do universo). Atingido esse estágio, nossa
busca na vida passa a ser a do aprimoramento próprio. Passamos
a assumir a direção, como diz Yogashririshnam (in
Ser e Existência,
psicografia de Elzio F.
Souza), ao reconhecermos a
existência de forças inconscientes, as quais nos conduzem ora para
um lado, ora para outro. Esse é o momento em que deixamos de agir
automaticamente, respondendo de forma imediata às forças inferiores
da vida, forças essas que são de nossa própria natureza, e
quando emerge, no dizer do autor, uma “Força desconhecida, mais
potente do que todas as que tenha podido conhecer e que (…)
[aguardava] o momento de erguer-se para verticalizar seus propósitos
e destino”.
O
aprimoramento próprio
santifica o homem.
O homem santificado converte o
mundo para Deus.
O
processo de santificação é, portanto, fruto do trabalho de
aprimoramento do homem, o qual é desenvolvido proporcionalmente
ao esforço empenhado. Assim, aqueles que acreditam que o desencarne
promove o indivíduo a uma condição diferenciada em termos de
evolução espiritual, enganam-se. Em
Missionários da Luz (André
Luiz / Chico Xavier), o
instrutor Alexandre, falando a um grupo de encarnados desdobrados
durante o sono, afirma que “desencarnação não expressa
santificação”. Diz ainda que:
Coletivamente, não somos duas raças antagônicas ou dois grandes
exércitos, rigorosamente separados através das linhas da vida e da
morte, e, sim, a grande e infinita comunidade dos vivos, tão somente
diferenciados uns dos outros pelos impositivos da vibração, mas
quase sempre unidos para a mesma tarefa de redenção final!
Ainda
abordando a questão do processo de santificação, podemos
recorrer a L’in
Ch’eng Yü (in
Caminhar Vazio),
onde, na mensagem homônima Caminhar
Vazio,
o autor assinala
que
Caminhar vazio
é percorrer – livre e solto,
sem prisões, sem algemas,
as estradas da vida.
Ou
seja, refere-se ao processo de renúncia que tratamos acima, e
também como exposto na questão 11 do Livro
dos Espíritos,
que afirma que compreenderemos o mistério da Divindade quando não
mais tivermos “o espírito obscurecido pela matéria” e pela
perfeição alcançada nos houvermos aproximado de Deus.
Continuando,
(…) Caminhar vazio – caminhar com Deus –
é adquirir a imobilidade divina.
Imobilidade,
sim.
Na questão
13
do Livro dos
Espíritos,
encontramos dentro
dos atributos divinos,
a
ideia da imutabilidade divina,
ou
seja, ele
é.
Já
no que diz respeito à alma, vemos no livro Self-Knowledge
[19],
traduzido
do sânscrito e com comentários, notas e introdução de Swami
Nikhilananda,
que, embora Atman (de
forma geral, espírito)
seja consciente por natureza, são-lhe
atribuídas as características de nascimento, desenvolvimento e
morte, porque
isso forma
a base
de toda
a nossa
experiência. O
que
ocorre
é que essas
características são sobrepostas a
Atman.
Pensemos
na situação em que uma pessoa realize uma boa ou má ação em
plena luz do dia. Teremos um bom ou mau resultado, mas a luz do sol
não será afetada por ele. Da mesma forma, a alma, ao se envolver em
situações boas ou ruins, irá
vivenciar os resultados de acordo com a lei do carma, mas Atman não
será afetado.
Assim,
atingimos o estágio em que nos unimos ao Pai, uma união tão
esperada e festejada,
e
tão bem descrita
na Parábola do Filho Pródigo:
(…)
Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu;
entretanto cumpria regozijarmo-nos e alegrarmo-nos, porque este teu
irmão era morto e reviveu, estava perdido e se achou. (Lucas
15:31-32)
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